Projeto
Quando criei este projeto não sabia exatamente que formato teria. Era interessante pensar a partir de uma máscara da Clarice Lispector: Helen Palmer, que é em si mais que um pseudônimo. Na máscara, percebemos a própria Clarice escoando pelas frestas, nas entrelinhas. E esse percurso a atriz Maria Fernanda Cândido percorreu, expondo o trajeto entre Clarice Lispector e Helen Palmer com delicadeza. Não era simplesmente uma voz, uma narração, muito ao contrário, ela encarnou um jogo duplo, de natureza híbrida, que é a Helen Palmer de Clarice.
Narrativa
Me interessou ser também um outro diálogo, uma proximidade, uma cumplicidade com as leitoras, como se fosse quase como um Facebook da época. Entendi que no conjunto de conselhos dos almanaques, Clarice buscava temas que dialogavam com mulheres jovens e de idade mais avançada. A estrutura foi formada por três mulheres: uma pós-adolescente; uma jovem mulher, um pouco atrapalhada, cômica; e uma mulher madura, que poderia estar em um momento de crise existencial.
Direção de Arte
A linguagem do projeto, do ponto de vista estético, é uma homenagem às propagandas e aos ensaios de moda daquele período (anos 1950 e 1960). Nas revistas, encontrava-se página inteira em amarelo com a modelo vestida de vermelho, apoiada em carro azul e branco. Um minimalismo das cores e do não-cenário, muito característico do excelente design da publicidade da época. Na concepção, despojamos ao máximo os elementos cenográficos, centrando a dramaturgia espacial nas cores e nos figurinos para que a voz se tornasse preponderante.
Temas Eternos
Nos almanaques existem algumas passagens e conceitos que talvez tenham envelhecido. Por outro lado, notamos a sensibilidade no olhar, a verve, o despojamento do texto, e, principalmente, a atualidade de certas questões do feminino. Somos convidados a refletir se algo mudou ou não mudou. Tivemos grandes avanços, mas também grandes cristalizações. Os textos escolhidos espelham os pontos que continuam absolutamente iguais no universo feminino. Não por um atraso da sociedade, mas por condições arquetípicas e humanas. Amar e ser amada. Como vencer a crise do relacionamento? Que roupa escolher para ir ao primeiro encontro? Não importa a classe social das mulheres presentes no almanaque, não importa se ela é antenada, se ela fez pós-graduação. São perguntas de 1800, de 1950 e serão em 2300. As questões sobre afeto e relações humanas são eternas. Essa perenidade do texto contida em um simples almanaque. Somos modernos, pós-modernos… Será?
Neste ponto acho moderna a reflexão de Clarice Lispector de “estar vestida com o seu sentimento”. E a escritor completa: “mas se você quer uma ajudinha maior: use uma fita amarela”, como no primeiro episódio da série. A fita amarela é para te deixar mais segura, para ter fé. Fé no amor.