Um homem vestido de sol
Estávamos sentados frente à frente. Já haviam se passado algumas horas de conversa sobre as personagens, a adaptação, até que as minhas perguntas foram nos levando, cada qual pela sua estrada, ao tempo de nossas infâncias. Ariano se virou para mim e com a sensibilidade de sempre me perguntou: “Quantas imagens você tem de sua mãe?”. Eu imediatamente respondi: “Uma!”. E passei a descrever a luz, o cenário, onde estava a câmera, onde estava ela. Ariano se virou para mim e disse: “Então sou mais feliz que você, meu amigo, eu tenho cinco do meu pai.” Algo inexplicável foi selado ali, naquele silêncio que veio a seguir, como uma comunhão.
De uns anos para cá, meu interesse pela cultura brasileira, sem que eu premeditasse, serviu de apoio e estímulo para dar início a esta viagem desenfreada ao encontro do passado de minha mãe, seu rosto nordestino. As histórias daquele tempo me chegavam como fábulas embaçadas e incompletas. Fui juntando-as, uma a uma, procurando tornar aquilo real. Por outro lado eu não encontrava no meu trabalho um universo correspondente, algo que me levasse a transformar aquelas imagens em canal para minha expressão.
Felizmente, há alguns anos, fui presenteado por Sebastião Vasconcelos com A Farsa da Boa Preguiça, de Ariano. O impacto foi imediato, já de saída encontrei ali a mistura de elementos populares místicos que procurava. Foi como se todo o meu sangue respirasse e acompanhasse a leitura. Corri para ler tudo de Ariano, ouvir as músicas do Quinteto Armorial e tudo o que cerca seu rico universo. Ariano passou a influenciar todos os meus trabalhos que envolviam brasilidade (Os Homens querem paz, Auto da Nossa Senhora da Luz e Renascer)
Estou muito feliz por ter conhecido um Mestre, um mestre-poeta. Um mestre da alma deste povo tão sofrido, um mestre com coração de Dom Quixote e olhos de Antonio Conselheiro.